A viúva e a moça saudaram o visitante e retribuíram-lhe
as saudações: “Shalom aleichem” (“Que
a paz seja convosco”). De conformidade com o costume da família, acolheram o
parente com um beijo na face e conduziram-no para o lugar de honra, o assento
do chefe junto à mesa.
A jovem Maria apressou-se em colocar refrescos
diante do visitante e um prato com nozes, amêndoas, passas e um pão asmo. Reb
Elimelech rendeu graças antes de comer um ou outro fruto que lhe haviam
oferecido, de depois, segurando um pedaço do pão, explicou a razão de sua vinda
com um versículo das Sagradas Escrituras:
— O rei Salomão, que a paz de Deus seja com
ele, disse: “Lança o teu pão sobre as águas, porque, depois de muitos dias, o
acharás” (Eclesiastes 11.1). Foi o que
aconteceu agora. Meu primo Jacó, o qual, conforme você sabe era parente do seu
marido, há tempos viveu aqui conosco. Deixou a cidade há muitos anos e
dirigiu-se para as montanhas da Judéia. Nunca mais o vi nem tive notícias dele desde
então. Somente hoje é que me chegaram informações sobre sua pessoa. Tinham-se
passados tantos anos que eu receava que esse ramo da nossa família tivesse
desaparecido para sempre em Israel. O pão que foi lançado às águas voltou hoje
para nós! Um estranho bateu hoje à minha porta ao romper do dia. Quando lhe
perguntei quem era, ele respondeu: “Sou seu parente. Meu pai, que a paz de Deus
seja com ele, era seu primo e chamava-se Bar Jacó, da casa de Davi, e eu me
chamo José”.
— Sim, recordo-me do dia em que acompanhei Reb
Jacó até fora da cidade — interrompeu a viúva. — Meu marido foi com ele até uma
distância de duas milhas.
Enquanto falava, Hannah protegia os olhos vermelhos
contra a luz da lâmpada, erguendo até a testa a mão calejada pelo trabalho.
— Encontramos novamente o pão que lançamos
às águas —. prosseguiu Reb Elimelech. — Reb Jacó morreu, mas o seu filho, que é
um homem forte e temente a Deus, voltou para a terra natal do pai.
— E qual é o objetivo da vinda desse
jovem? Ele pretende ficar aqui conosco?
— Sim,
pois trouxe consigo a habilidade de suas mãos, a profissão de nossa família.
Ele também é carpinteiro.
Neste momento, Reb Elimelech fez um discreto
sinal com a cabeça para a viúva, e ela compreendeu imediatamente o que ele
queria dizer. Hannah virou-se para a filha e disse:
— Os animais têm que comer amanhã bem cedo
e já está ficando tarde. Vá deitar-se, minha filha. Eu ainda fico aqui
conversando um pouco com o seu tio.
Maria levantou-se, curvou-se diante da mãe
e do tio, e retirou-se para o seu quarto. Assim que ela saiu, Reb Elimelech
continuou:
— Quando meu irmão, o seu marido, Reb Hanan,
adoeceu e soube que logo iria ajuntar-se aos nossos antepassados, chamou-me
junto ao leito e me fez jurar que eu faria com que a sua caçula Maria só se
casasse com um homem de uma família que nos conviesse e fosse da Casa de Davi.
Ele amava a caçula mais do que a própria vida, porque ela alegrara a sua
velhice.
— De fato, foi isso mesmo — confirmou a
viúva. — Meu marido sempre desejou um filho que construísse o seu lar em nosso
país Israel, antes ou depois que ele morresse. Deus, porém, certamente por causa
dos meus pecados, não me concedeu a graça de poder oferecer-lhe um filho homem.
Quando a caçula nasceu e ele viu que era mais uma filha, disse-me — lembro-me
como se fosse hoje: “Não te preocupes, minha esposa, pois eu amarei essa minha
filha mais do que a dez filhos”.
E assim Maria ficou sendo para ele como um
grande presente que Deus lhe dera. Meu marido a criou como o filho que ele não
teve. Ensinou-lhe a ler e a estudar os mandamentos da Lei. Quando ela completou
15 anos, ele mandou-a a Jerusalém e deixou-a por algum tempo na casa de meu
irmão Zacarias e outros parentes que eu ainda tenho por lá, a fim de que ela pudesse
servir no Templo do Senhor com suas habilidades, conforme sempre fazem as moças
israelitas.
— E agora o Senhor me permitiu que eu cumprisse
a promessa que fiz ao seu esposo —, disse Reb Elimelech rapidamente antes que
ela pudesse continuar. — Saiba, pois, Hannah, filha de Jochebeth: o jovem que
cruzou hoje a soleira de minha porta descende, como nós, da linha pura e
sagrada de nosso pai Davi e da nossa avó Ruth. A finalidade de sua vinda à
nossa cidade é esta: se for do seu agrado e do agrado de sua filha, ele estará
disposto a recebê-la como esposa e construir o seu lar em Israel, aqui conosco,
em nossa cidade.
— Quando ele me confessou isto — continuou
Reb Elimelech —, resolvi vir hoje mesmo à noite defender a sua causa diante da
mãe da jovem, pois esse rapaz me despertou muita simpatia. Ele teme a Deus e, mesmo
que seus conhecimentos dos mandamentos do Senhor não sejam muito profundos, percebe-se
que ele tem a firmeza e o caráter de nossos maiores antepassados. Tem uma vida
consagrada e é muito humilde.
— Deus ouviu então as orações de uma
viúva! — exclamou Hannah, erguendo os braços. — Na minha velhice, era somente
isso que atribulava o meu coração. Como poderia a minha filha casar-se com
alguém de nossa família, sendo nós tão pobres? Esta é uma grande notícia, Reb
Elimelech, mais apropriada para o Sábado. Traga nesse dia o rapaz à nossa casa
a fim de que ele possa ver a minha filha. Se os jovens simpatizarem um com o
outro, providenciaremos, com a ajuda de Deus, para que se casem antes de findar
o mês de Adar.
O assunto encerrou-se nesse ponto. A viúva
pegou a lâmpada de óleo que estava sobre a mesa e acompanhou o visitante até à
porta. Como ele estava só, entregou-lhe a lâmpada para que pudesse iluminar o
caminho. Ele a devolveria no dia seguinte. Hannah voltou em seguida para dentro
de casa, onde a jovem Maria, sem sono, deitada na sua cama, contemplava pensativamente,
com seus olhos negros e brilhantes, as estrelas que brilhavam através da
janela. Tinha a impressão que lá do Céu infinito Deus também a contemplava como
se ela fosse uma estrela.
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