O viajante vinha de um ramo empobrecido dessa poderosa família
(Mt 1.16; Lc 1.27). Carpinteiro de profissão, filho de pais cuja fortuna fora
confiscada por Herodes, não podia alimentar esperanças de ser aceito como genro
de uma das ricas famílias da Casa de Davi.
Essas famílias, para não perderem seus bens, haviam
feito as pazes com Herodes, e por isso podiam manter palácios de inverno em
Jerusalém, e casas de verão nos jardins de Jericó.
Porém, aquele
carpinteiro soubera que uma viúva, com duas filhas, descendentes da casa de
Davi, viviam na longínqua cidade de Nazaré, cujas humildes casas se erguiam
diante do belíssimo vale de Jezrael.
À margem de uma estrada
de pouco movimento, a cerca de 25 km do Mar da Galileia, e a cerca de 9 km a
oeste do monte Tabor. O pai, que falecera há pouco tempo, vivera sempre como um
pobre agricultor, mas fora um homem temente a Deus.
A filha mais velha, Mariama, esposa de um
artífice, mudara-se para a casa da sogra, mas continuava auxiliando a mãe e a
irmã a cultivar o pequeno pedaço de terra que o pai deixara para a família em Nazaré.
O viajante preferiu viajar à noite, em parte para evitar o
calor intenso que fazia durante o dia, e em parte porque sentia o espírito
atribulado, cheio de incertezas, e queria, no silêncio da madrugada, falar
insistentemente com Deus.
Sentia-se como um cordeiro que tivesse sido
levado para um campo aberto e aí abandonado. Desde a infância, fora obrigado a
sustentar-se com o fruto de seu próprio trabalho.
Jamais pudera ir à
Jerusalém para sentar-se aos pés dos grandes rabinos e dos sábios, e aprender
com eles. Os seus estudos não tinham ido além do que aprendera quando criança,
mas serviram para estimular o seu grande desejo de conhecer os mandamentos e a
justiça de Deus.
Guiara-se, na falta do pai, da mãe e de outros parentes,
por esses poucos conhecimentos que adquirira em seus dias escolares, e dos quais
se lembrava – algumas citações dos profetas, e vários Salmos que sabia de cor.
Da mesma maneira que
mantivera o corpo com o trabalho de suas mãos, soubera também alimentar o
espírito com os tesouros armazenados no peito. Não julgava fossem muito ricos
esses tesouros, mas sentia-se satisfeito com eles.
Jamais se queixara da vida modesta que a sua
profissão lhe proporcionava, e vivia feliz com os conhecimentos superficiais
que tinha dos Salmos, os quais recitava constantemente para si mesmo, como
estava fazendo naquele momento ao cavalgar através dos montes, sob um céu ainda
cheio de estrelas.
A recitação dos versículos do rei Davi não
o impediu de prosseguir em suas meditações. Ah se Deus o ajudasse a conseguir
as boas graças de seus parentes em Nazaré, da mãe viúva e da jovem Maria que ele
queria como esposa!
De repente, José estremeceu como se estivesse entrando em um
território sagrado. Sentia como se estivesse indo na direção da história que
Deus escrevera.
Sentia como se tivesse
tocado em alguma coisa sagrada, como se tivesse segurado a própria alma entre
as palmas das mãos.
Parou o jumento, desceu
e derramou a água do vaso de couro que levava consigo, que era destinada à
cerimônia de purificação das mãos.
Ajoelhou-se depois sobre a terra molhada e, à
semelhança de Jacó em Betel, ergueu os braços, enquanto seus lábios murmuravam
a súplica que estava pronta e amadurecida no seu coração:
(Continua amanhã)
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